No fim do expediente, será essa uma verdade absoluta? Não em terras tupiniquins
Um simples ditado popular simboliza a motivação, incita a força de vontade e a resiliência de qualquer trabalhador. Entretanto, nos últimos anos, com o avanço do sistema capitalista, a frase “Deus ajuda a quem cedo madruga” tornou-se uma forma de romantizar o trabalho em excesso.
O trecho final “quem cedo madruga”, não necessariamente se refere à quem inicia suas atividades profissionais durante a madrugada, e sim, àquele que ocupa a maior parte do seu tempo de vida com o trabalho. Segundo o ranking da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 2023, o Brasil tem uma jornada de trabalho semanal acima da média mundial. A média é de 38 horas de trabalho por semana, e a do Brasil, 39 horas. Além disso, o Brasil ocupa a 15º posição no ranking mundial de horas trabalhadas por semana. Um dos responsáveis pela elevada carga horária no país é a escala 6x1. Essa escala consiste em 6 dias de trabalho para um dia de folga na semana.
Psicologicamente, a sobrecarga no trabalho pode gerar diversos problemas de saúde mental, impactando no rendimento do trabalhador. “O trabalho em excesso pode levar a uma série de impactos psicológicos negativos, incluindo aumento do estresse, ansiedade e depressão. A sensação constante de pressão pode diminuir a autoestima e a satisfação pessoal, além de provocar um esgotamento emocional conhecido como burnout. Este estado de exaustão profunda afeta a capacidade de pensar claramente, a motivação e o prazer nas atividades diárias”, afirma a psicanalista clínica, Roberta Caroline de Oliveira Garcia. De acordo com a pesquisa da Infojobs, realizada entre agosto e setembro de 2023, 86% dos funcionários brasileiros mudaram de emprego para preservar a sua saúde mental.
O movimento Vida Além do Trabalho (VAT), fundado pelo influenciador digital Ricardo Azevedo, vem ganhando forças no primeiro trimestre de 2024. Mais de um milhão de pessoas já assinaram a petição feita pelo movimento com o objetivo de revolucionar o sistema trabalhista no Brasil. Nomeadamente, o propósito do movimento é pôr fim à escala 6x1 e implementar uma jornada alternativa, como a escala 4x3 ou 5x2. “A escala 5x2 proporciona um equilíbrio melhor, oferecendo dois dias consecutivos de descanso que permitem uma recuperação mais completa e tempo suficiente para atividades pessoais e familiares. Em contraste, a escala 6x1 pode levar a um descanso insuficiente e uma sensação de perpetuação do ciclo de trabalho, dificultando a desconexão do ambiente profissional”, completa Roberta Caroline de Oliveira Garcia.
No entanto, é necessário ter atenção para os impactos negativos que a mudança na escala de trabalho trará para a vida do trabalhador. Essa transição pode trazer resistência daqueles que já estão habituados a apenas um dia de folga. Além disso, o custo operacional terá um aumento significativo, ao ver a necessidade de contratar mais colaboradores para que os dias de folga adicionais sejam compensados por outro servidor. É imprescindível que seja repensando a distribuição das atividades para que a produção não seja afetada e não sobrecarregue os profissionais.
A discussão sobre qual é a melhor escala e quais serão seus impactos na sociedade em relação aos seus aspectos econômicos e sociais é necessária, visto que a desigualdade racial, social e de gênero são feridas abertas do Pindorama. É vital debater formas de melhorar a vida e o trabalho dos trabalhadores brasileiros, que vivem sob o castigo de Sísifo. E como dizia Emicida:
“Deus ajuda quem cedo madruga pro turno, imagina o que ele vai fazer por mim quando ganhar que eu nem durmo?”.
Discutir sobre o assunto é o primeiro passo para assegurar nossa dignidade enquanto trabalhadores. Parabéns, Kris! Excelente texto!
Um assunto extremamente necessário!!!
Pauta importantíssima!
Posicionamento forte e necessário! Vivemos na era da produtividade a qualquer custo e do esgotamento mental.